terça-feira, 17 de junho de 2014

Racismo e Feminismo

      Não tem nada que me irrite mais do que quando vejo feministas brancas, que se dizem preocupadas com o racismo, mas vivem deslegitimando os argumentos das feministas negras. E ainda insistem nessa história de que racismo não pode existir no movimento feminista. O simples fato de não falar sobre pautas negras já faz desse espaço excludente, isso faz o espaço ser racista, que não está falando sobre nós negras. O racismo esteve tão presente no feminismo que se você for lá no inicio e procurar as negras, você vai descobrir que por causa do racismo, DENTRO DO MOVIMENTO DE MULHERES, nós tivemos que nos organizarmos separadamente. Foi por isso que surgiu o Feminismo Negro, e o termo "negro" não veio atoa, ele veio, justamente, para marcar que aquele outro espaço não discute raça, é um feminismo para mulher branca! RACISTA!

        É assim que vejo o quanto que tem gente branca dizendo que acha que falar sobre as questões das mulheres negras é importante, mas me surge transbordando teorias e mais teorias de teóricas brancas para vir dizer à mim, que sou negra, que o que eu estou problematizando não tem sentido.

        Eu quero saber se essas pessoas sabem quem são as teóricas negras que discutem o feminismo e o que elas falam sobre o fato de negras se organizarem separadamente por causa do racismo... Eu quero saber se essas pessoas sabem quem são mulheres como Sojouner Truth, ex escrava, e porque ela foi a ÚNICA mulher negra em uma convenção NACIONAL FEMINISTA em 1850 e a ÚNICA que estava falando sobre mulheres negras naquele lugar. Vamos procurar saber das guerreiras negras que lutaram e continuam lutando, no Brasil e no mundo, por um mundo mais justo também? Ou vamos continuar ignorando-as como se o feminismo só tivesse respaldo e história quando protagonizado por vozes e teóricas brancas?

        Se essas pessoas realmente se importassem com nossas questões, se tivessem buscado essas mulheres que falam muito bem do nosso lugar de fala, que é o de mulher negra, não estariam falando essas coisas. Com certeza estariam problematizando o cenário feminista atual e não questionando a nós negras sobre a legitimidade do nosso argumento.

        Deslegitimar nosso argumento é fácil, aliás é um péssimo costume histórico de achar que nós não sabemos e que nós não podemos, que vocês é quem sabem, que vocês é quem devem falar por nós, até porque, né? Vocês são brancas... Ou devo chamar isso de racismo? Pelo visto o monstrinho ainda persiste...

        Eu tenho vivência, tenho argumento e tenho voz!
Vamos deixar a hipocrisia de lado e parar de achar que representar mulher negra é colocar bonequinha preta no cartaz. Temos pautas concretas e sérias.

        Exigimos respeito!!

Escrevi isso no dia 25 de maio de 2014. Escrevi porque teimei em ler comentários...
Ressaltando que Feminismo Branco é um feminismo que não discute as especificidades de outras mulheres que não são brancas. Chamo de feministas brancas, aqui, as que se posicionam como se todas as mulheres fossem brancas, ou seja, não discutem especificidades.


Sheu Nascimento.

4 comentários:

Bruna disse...

Aguardando novas postagens!

Unknown disse...

Pois seria uma séria cegueira não observar na "ordem do dia" as assimetrias de tratamento entre tópicos e vertentes dentro do próprio movimento feminista, sobretudo, no aparato de reivindicações da pauta de mulheres negras. Lembro-me então de Martín Paradelo Núñez ao denunciar o quanto o anarquista negligenciou as mulheres por não considerá-las sujeito dignos de emancipação social - quando muito elaboraram relatos tímidos desse enfrentamento. Ora, não é mais ou menos o que vemos eclodir entre as próprias feministas tradicionais sobre o movimento feminino negro?

Sheu Nascimento disse...

Os problemas raciais que existem no feminismo é histórico e não atual. Minha maior preocupação é porque com os avanços nas políticas afirmativas na educação, ainda que tímidas, estão levando às meninas negras a problematizarem as diferenças de gênero de forma mais acentuada, só que muitas delas acabam se iludindo dentro de um feminismo que chamarei aqui de "mais acessível" porque ele é enxuto, com pautas superficiais e é excludente já que não contempla as pautas de raça...
Quando a gente, como mulheres negras, vamos questionar essas questões nós somos silenciadas por uma série ações e falas que refletem a resistência de reconhecer a dignidade humana da pessoa negra.

Drika L.S. disse...

Gostei muito, Sheu, às vezes é necessário fragmentar para unificar..
Precisamos de pessoas como você! E mais textos como esse!!!
Você é uma inspiração!
Parabéns!!!
Beijos