Defender
e respeitar a agência das mulheres negras sobre seus corpos e sexualidade é uma tarefa difícil no Brasil. Sabemos que vivemos em um
dos países mais perigosos para se nascer uma menina e como que o Brasil é
conhecido mundialmente como um paraíso do turismo sexual. Além disso, muito conservador,
racista, sexista e lesbofóbico, onde o olhar do opressor, o sujeito padrão homem branco está,
a todo custo, tentando nos provar em que lugar a negra deve estar e o que a
negra deve ser.
Vivemos sob a sombra da imposição de um
olhar, ou uma construção social, de que a menina negra amadurece sexualmente
mais cedo e, por isso, mais cedo podem "corresponder" aos desejos dos
homens. É bem cedo que experienciamos a violência da hiperssexualização, todas
nós, meninas e mulheres, como corpos sem dono, um corpo de todos, para o toque,
para o olhar e para o abuso, nunca nosso.
Sendo uma mulher negra e lésbica fico
pensando como essa dinâmica da hiperssexualização pode ganhar um tom ainda mais
assustador sobre nós. A invisibilidade das lésbicas negras começa quando nossa existência é negada pela marca racial assim, "mulheres negras nascem para corresponder os desejos dos homens". Sendo lésbicas, entramos em um lugar muito específico da hiperssexualização, onde a lesbofobia corresponde a um potencializador para a nossa condição de marginalidade social.
Andando na rua de mãos dadas com minha
companheira, trocando afeto porque temos vontade, rapidamente somos
"convidadas" para programas sexuais como se estivéssemos ali à
procura disso. Se eu me amo, amo o meu corpo, amo outra mulher e exponho esse
amor, eu não quero que isso seja manobrado negativamente para reforçar a
violência da hiperssexualização sobre mim, até porquê:
"Somos
humanos, (embora a nossa humanidade seja muitas vezes questionada) e por isto
as mulheres negras são, em geral, pessoas sexuais, assim como todos as outras.
Nossa sexualidade é algo que é inerente à nossa pessoa, e isso é algo que
devemos ser autorizadas a reclamar livremente (ou rejeitar) sem medo de
represálias ou repercussões."
[https://www.geledes.org.br/hipersexualizacao-da-mulher-neg…/]
Então eu penso: como posso me proteger disso?
Me recuso a me esconder, e nem quero ocupar esse lugar de sujeito assexuado. O
respeito a nós não deve ser mediado pelo controle de nossas ações pois, isso
continua a reforçar toda a lógica perversa que violenta a nossa saúde mental e
física e fortalece a cultura do estupro, transferindo para nós a culpa pelas
violências que poderemos vir a sofrer.
"Avançar
de uma forma reacionária, recusando-se a ser sexual simplesmente por causa
daquilo que a sociedade pode esperar de nós (por causa de nossos corpos
femininos pretas), é negar a nós mesmos uma parte de nossa própria humanidade,
a fim de reivindicar a nossa humanidade. Na minha cabeça, isso é
contraintuitiva. Nenhuma pessoa deve ser obrigada a rejeitar a sexualidade no
serviço de sua humanidade, porque a sexualidade faz parte da humanidade."
[https://www.geledes.org.br/hipersexualizacao-da-mulher-neg…/]
O enfrentamento à hiperssexualização
do corpo da mulher negra é uma pauta de muitos anos, que foi, e ainda é muito
urgente! Uma ferramenta que tem servido
para nos impedir de avançar, deixando sempre lacunas em nossas vidas, exigindo
de nós um esforço altíssimo para que possamos alcançar as nossas conquistas,
saturando a nossa saúde mental e controlando nossos corpos.
- Sheila Nascimento (Sheu).
Texto de apoio: A hiperssexualização da mulher negra e a política da respeitabilidade.
<https://www.geledes.org.br/hipersexualizacao-da-mulher-negra-e-politica-da-respeitabilidade/>
Texto de apoio: A hiperssexualização da mulher negra e a política da respeitabilidade.
<https://www.geledes.org.br/hipersexualizacao-da-mulher-negra-e-politica-da-respeitabilidade/>